quinta-feira, 24 de setembro de 2009

A Canção do Mar

Eu era o Mar
E sequei.

Um dia fui a Turbulência Índigo;
Hoje sou uma sobra cuspida
- numa alma rota -
De um redemoinho

Que pintei dourado
Com meu pincel
- que hoje me é fantasma -

Mantenho-no pendurado à janela
Manchando a Palmeira
- a das minhas raízes -
Apodrecendo-a com a tinta preta
Que ja foi meu sangue

Meu maltratado sangue seco
Agora é história,

Está nos livros, está nos cadernos,
Está na terra em que me descontruí
Continuamente

Ao me esquivar do Mundo,
Cortar minhas asas
E meus Dedos,

E perder a Essência

...

Veja, Eu era o Mar
E Sequei

Agora tudo é disforme Sal,
Como daqueles
Que olham para trás
Turbu(-)lentamente.

domingo, 28 de junho de 2009

Canção das Dores

Eu conheço dores

Aquelas que corroem a alma
quando nem mais a alma sobra
Para me sentar e de tanta dor
Escrever para parar de doer

E colar os cacos de sonhos
Que caem em meus ombros e costas
E as arranham
- como sangram as minhas costas -;
Cai o sangue quando aqui sento para orar

Para poder levantar quando me acordar
Ignorando outra caída pois,
Deus me avisa,
Ela virá
E não vai me esperar calçar

Minhas botas anti-espinhos-metálicos
Anti-estranhos-bufões,
Anti-espasmos-modernos,

Nem minhas calças furta-cores-do-mundo,
Furta-odores-do-mundo,
Furta-calor-do-mundo,

Muito menos minhas camisas negras
Que absorvem a Luz e me reconstroem
- com minha benção, caras, todas elas -
Como que erguendo o Eu-Muro,
o sítio turístico, o para se conhecer,
- Você sabe, conheceu-o do exato mesmo jeito
Que se levanta uma cerca de espinhos,
Os inorganicamente mal-feitos,
Como os que adornam minhas palavras
Inorganicamente mal-feitas como um camafeu,
Um dos que pingam segredos.

Mas conheço outra dor,
Uma pior que qualquer outra dor
Mesmo a do muro de espinhos ou as de Amor,

É a que dói quando se olha as nuvens pelos dois lados
e se percebe suas conjugações todas no passado
Maiores que o que agora se pode enxergar.

terça-feira, 16 de dezembro de 2008

O Rio de Lágrimas

Eu vejo as lágrimas de um Anjo
Que caem sorrateiramente
Pelas paredes de minha casa,
Inundando-a num torpor
De devoção que me tormenta
Quando percebo que só as asas
De outro anjo qualquer
Podem levar embora.

Essas lágrimas furtaram as Cores
Do jardim que cultivei com esmero,
Onde cresciam amoras para alimentar
Os rouxinóis - os que cantavam o desespero
Do meu alimento de amor,
O que agora não tem mais Cor;

Fiquei cego de Cor,
Nada me é mais que preto ou branco -
Nem mesmo o marrom enferrujado do Banco
(Um que outrora sentei e,
Assistindo um Anjo cair,
Lia um livro que jamais terminarei)
Enxergo mais.

Depois foram embora os Sons:
Cessaram todos os meus cantos,
Morreram minhas Orquídeas -
Vesti-me de preto pela Melodia:
Perdi a Melodia das Orquídeas,
A que batia ao Noite-Dia
E à Água que caía
(Não por esta casa,
Esta que agora deságua em prantos,
Mas pela de cima, a da ventania,
A que morei um dia e, sabe Deus,
É o que mais desejo agora).

Agora só as lágrimas arranham o ar,
Com a lâmina fria do silêncio
Dissecam-me com curiosidade infantil
E tentam despir-me da Divindade,
O tipo de realeza que se gosta de cultivar:
A do Homem que brilha e aquece,
O dono das Canções do Desalento,
Talvez não as mais belas ou cheias de alma,
Mas é Ele, o detentor do Artifício,
E virgens deitarão sobre seu altar.

Mas as lágrimas roubam-me o calor,
Solidificam meu sangue, entopem minhas veias;
Meu jardim que já era preto e branco
Agora é só gelo-cinza;
Viraram balas as minhas amoras,
Vejo facas brancas onde havia pétalas
E elas parecem me perseguir...

Corro à luz de Aldebaran, que me protege,
Mas a esfera-Índigo de Cerâmica quebrou-se,
Num estalo, num estrondo, num ínfimo instante,
E de lá caíram todas as luzes do Mundo;
Então tropecei na borda do rio de lágrimas,
Que congelado não fluía mais,
E de relance vi-me pela última vez:

Não era mais que nada,
Um assobio no vácuo,
Um grito no escuro,
A figura da agonia do fim do ser
Mesmo sem nunca ter sido.

Riu-se,
o Anjo de longos cabelos louros,
Em regozijo
E emoldurou-me numa parede,
Junto de tantos outros,
Que a duras penas,
Aprenderam a não amar um Anjo.

sábado, 22 de novembro de 2008

Canção do Desespero

É a mesma canção
Os mesmo versos,
As mesmas dores e rimas.

Fiz novamente
Mesmo quando nada apontava,
Tudo conspirava, não é?

Ah, se meus olhos me respondessem mais
Ou minha boca me ouvisse mais

Meus fractais não seriam tão caóticos,
Minha bolha se dissolveria
No nada que almejo
Desde o dia 1.

A mesma canção, Joni,
A mesma canção.

Traga-me a guitarra espanhola
E o Vinho,
Joni, traga-me o Mundo,
Pois, quem sabe,
Também poderei ser do Mundo,
Azul como o Mundo,
Ter a o Verde que o Mundo tem

Sem precisar queimá-lo
Ao som das mesmas canções,
Nem precisar escrever-lhes
Os meus tortos velhos versos
Contando minhas repetidas dores
Sem saber nem mais rimar.


quarta-feira, 5 de novembro de 2008

Sonhos

É uma pena quando morre um sonho
- Morre uma fada,
- Um unicórnio ou um gnomo -
Pelo menos os que povoavam meus sonhos
Os que teimam em morrer

E me deixar seco que nem cascalho velho,
Como os das terras que habitavam as flores,
as que coloriam meus sonhos;

Mas agora não tenho sonhos nem flores;
Morreu meu sonho e murcharam minhas flores;

Delas não sobrou nem o perfume pueril,
Um de doces lembranças
Como os da minha caixa de infância

A minha caixa cheia de reminiscências
Que guardo debaixo da cama
A salvo do comedor de sonhos
Que dorme sobre ela

Sobre a minha cama ele tempera sonhos
Com ilusões que teimam a me enganar,

Umas ilusões quase-pútridas,
Uns sonhos quase-podres,
Futuramente mortos...

Esses sonhos-derrota,
Essa não-ação...

Mas os guardo,
Mesmo esses sonhos que me matam,
Pois, melhor morte é essa
Do que a de definhar de razão.

sábado, 18 de outubro de 2008

Licensa Poética

Eu?
Deverei eu honrar minha licensa poética até o fim?
Ignorar fatos e a gramática sempre que puder,
ou melhor,
Ignorar quando me for conveniente,
como quando deixei de usar todos os meus pentes
ou deixei de comprar pastas de dente
ou comecei a não dar mais bola pra gente que mente.

Me deixar distorcer o que vejo só para ficar mais bonito
no verso de um papel de pão quente que seja
Na trocentézima carta de amor perdida pela correnteza, meu bem, com certeza,
Isso me trará o prazer inefável da transgressão
E é o único que tenho...
...e olha que já está faltando

Pois já estou sucumbindo aos grilhões da simetria do mundo
e meus sonhos não são mais surreais
nem, ao menos, coloridos
nem, ao menos, fatais.

Quem sabe não está na hora de parar?
Vai ver que o fim é assim...

domingo, 14 de setembro de 2008

Um Ninho Feito de Penas

Você está vendo?
Minha árvore está morrendo.
Acontece todo ano,
Apesar dos meus alertas
Que queimam suas folhas;

E suas flores,
Às que devo a morte
De todas as minhas borboletas,
Estão caindo; e minhas borboletas,
Estas estão dançando

Em harmonia com meus espasmos,
Os que chamam de naturais,
Os que fazem a minha natureza
Ser a de que tudo volta
Por baixo de um lençol branco

Ou numa fotografia manchada de tempo,
Cujo verso me lembra das dores
Que não me perdoaria se esquecesse,
Pois ainda há em mim a esperança
De me arrepender e, de novo, não morrer

Como morre a minha árvore que,
Como vês, está morrendo
Assim como no ano passado
Quando a esculpi um corpo esbelto,
Daqueles dos meus sonhos

Que deixam meus movimentos agressivos
E minhas borboletas com raiva
De toda acidez que ingeri;
Então volta toda e cuspo fogo,
Derreto meus regadores e mangueiras.

Parece que arranjo todas as maneiras
De fazer minha árvore morrer
E, por fim, poder apreciar o fogo e padecer
Só para poder sentar aqui e escrever,
Como um ninho feito das minhas penas.